esqmarques

Coisas como casas ou canções

 

Sempre me interessou o que fica por dizer, o que se adivinha poder ter sido, a suspeita de outras coisas para além das coisas que existem. O que mais me fascina é o que sobra, pequenas manchas de pó, marcas de humidade e de respiração. Tudo tem um início, mas o fim, esse silêncio próximo da morte, nem sempre acontece quando se torna parte de nós.

Com as canções passa-se o mesmo. Uma canção é uma casa que se habita, um espaço que não nos pertence, mas que é, ao mesmo tempo, nossa pertença também. Fazemos parte delas, ocupando-as até ao mais íntimo pormenor. Se as coisas se passassem de outra forma, as canções seriam sons parados no tempo, melodias sem sentimentos, casas abandonadas, pequenos fósseis mercê da solidão eterna. Por isso, mas também por muitas mais coisas que não se entendem, nem se imaginam, resolvemos habitar as canções das nossas vidas. E nelas (falo de vidas ou de canções), inventamos caminhos que ninguém trilhou. Ouvimos canções, e sabemos que é nosso o sonho que ninguém sonhou.

 

Prefácio inspirado na canção House where nobody lives, de Tom Waits