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Francisco Fernández Naval é o autor de “O bosque das Antas“; um romance muito importante da literatura galega, que agora Bubok lança em portugués e em espanhol.

Francisco Fernández Naval

 

 

 

 

 

Francisco Fernández Naval, natural de Ourense e radicado em A Coruña desde jovem, publica com a editora Bubok as versões em espanhol e português do livro original em galego: O bosque das antas.
Esta história de um homem que fugiu para a serra depois do golpe militar de 18 de julho de 1936, escondido em bosques e aldeias de Ourense, ganhou o prémio Xerais em 1988, alcançando assim todos os cantos da Galiza.
Hoje, Bubok, dá a oportunidade a novos leitores de conhecer este romance traduzido para o espanhol e o português.

Olga Pastor-Quem é Francisco Fernández Naval?

FFN — Imagino que está a perguntar quem eu sou como escritor. Sou alguém que escreve porque sente que há emoções e experiências próprias que preciso compartilhar. Sempre me considerei o herdeiro de duas circunstâncias muito importantes na minha vida. O primeiro, por ser filho de uma extraordinária narradora oral, virtude que a minha mãe herdou do avô. Com ela, aprendi a contar. Ela sempre procurou que a minha irmã e mais eu amássemos literatura. A segunda, o emprego do meu pai no cinema Xesteira, em Ourense. Cresci a assistir filmes. O cinema ensinou-me uma forma particular de narrar.

OP — Comentou em alguma ocasião que se define como: “autor de uma literatura de vida, difícil de enquadrar num único género”. Poderia explicar o que quis dizer?

FFN — Procuro fazer com que a minha literatura esteja ligada à vida e interesso-me muito pelos cantos e pelas margens, pelas periferias do quotidiano que dificilmente notamos. Também gosto de detalhes. Penso que fazemos parte de uma rede, que é a vida, em que os detalhes são os nós da estrutura reticular que construímos e que nos liga. Esses detalhes, bem colocados num romance ou numa história, dão outra dimensão. A memória é muito importante para mim e tento compartilhar isso com o leitor. Memória compreendida do ponto de vista histórico, familiar, pessoal, territorial e paisagístico.

OP — A sua faceta de escritora vem de muito tempo atrás. Tem uma longa e prolífica carreira como autor, com muitas publicações de vários géneros: poesia, narrativa, ensaios, literatura infantil e juvenil. Conte-nos como foi sua carreira como autor e onde está atualmente.

FFN — Comecei a escrever poesia, mas logo percebi que tinha muito interesse em narrar, contar histórias, a possibilidade de criar mundos. Mas nem sempre posso escrever poesia e nem um romance ou um conto. Quando termino um livro, devo dar um tempo para silenciar as vozes da história anterior, ou os ritmos, tensões e buscas de um livro de versos. É por isso que mudo muito de género. Essa possibilidade permite-me estar sempre escrevendo, que é o que eu gosto, mas também descansar e deixar espaço livre para que outra história ou outro livro de poemas germinem. Nesse sentido, o ensaio ou a literatura infantil e juvenil são como um bálsamo, esvaziando-me para poder recomeçar.

OP — Para saber escrever, primeiro é preciso saber ler. Pode recomendar alguns livros e explicar a seleção para nós?

FFN — Para escrever é conveniente ler muito e cair na tentação de emular os autores de quem gostamos. Isso também é feito por pintores, escultores ou músicos. Um é autor no seu tempo por tudo que outros escreveram antes e disso é preciso aprender. Para escrever, antes de tudo, é preciso saber ouvir. Esteja atento às vozes externas e, principalmente, à voz interna. A música tranquila e a solidão sonora, como dizia San Juan de la Cruz.

OP — A sua vida desenrola-se entre A Coruña e Ourense, lugar onde se passa o romance que acaba de republicar. Porque sua cidade natal? O que Ourense tem para ser o território escolhido para a aventura de Pierre Francesco?

FFN — Ourense é a cidade onde nasci e nela acontece a parte de verdade que existe em O bosque das antas. Por outro lado, desde o século XIX Ourense é uma cidade com tendência para ser contada. Há muita literatura em que a cidade é protagonista, escrita por autores ourensanos ou por escritores nascidos no estrangeiro. Tem a sua peculiaridade. Um amigo meu costumava dizer que era uma cidade de Maharishis, agora acredito que empobreceu e que não é mais a mesma.

OP — Foi este romance a sua iniciação como escritor?

FNN — Como narrador sim. Mas antes disso já tinha publicado dois livros de poesia.

OP — Como era Ourense nos tempos da República? Fez muitas pesquisas sobre a época?

FNN — Bom, uma cidade pequena, burguesa, mas cheia de contrastes e tensões, muito bem refletida por Risco, Otero Pedrayo, Eduardo Blanco Amor. Para este romance investiguei, mas, primeiro, fui alimentado pela memória da minha mãe e o meu padrinho.

OP — Atualmente continuamos com a lei de amnistia desde os tempos de transição, dificultando muito as tarefas de recuperação de corpos abandonados em sarjetas, direitos protegidos pela lei da memória histórica ou os julgamentos de torturadores da época de Franco. Este livro é importante para a luta pela recuperação da memória histórica? O que acha da lei de amnistia espanhola?

FNN — O bosque das antas foi um dos primeiros romances galegos a abordar o tema da Guerra Civil, escrito por autores que não a tinham vivido.

Nesse sentido, penso que teve a sua importância. A única pessoa que falou comigo sobre a guerra desde que eu era criança foi a minha mãe. Na minha casa havia um livro, que agora guardo, intitulado: A dominação vermelha na Espanha, que era como um compêndio da causa geral aberta pelo regime de Franco contra a República. Listava os crimes cometidos pelos republicanos e as exumações realizadas para resgatar e enterrar os partidários assassinados do lado “nacional”. Quando criança, olhei para as fotos dos corpos alinhados nas valas comuns e os retratos dos mortos, todos identificados. Isso é algo que as vítimas da violência de Franco não podiam fazer. No seu relatório, o juiz Garzón estimou que havia 120,000 mortos enterrados em sarjetas e valas comuns.

Acredito que até que todos sejam exumados, a ferida aberta em 18 de julho de 1936 não vai sarar. Há uma demanda de familiares para recuperar os seus seres queridos, mas aqueles que sofreram o horror estão a morrer sem ver o sonho de dar a eles um enterro digno e amoroso realizado. Quanto à lei de amnistia… Foi um pacto de transição.

Na minha opinião, não se esta a cumprir as normas internacionais sobre Direitos Humanos. Em particular em relação aos crimes contra a humanidade, genocídio ou desaparecimentos forçados, que o direito internacional considera imprescritíveis. O tempo passou e a maioria dos perpetradores desses eventos morreu. Hoje eu contentaria-me em anular todos os processos que causaram a morte ou privação de liberdade de tantos espanhóis, acusados de crimes inexistentes; por exumar os corpos nas sarjetas e por escrever com objetividade o relato do ocorrido. Na Galiza, território que está sob o poder militar desde 24 de julho e onde não existia frente de batalha, foram cometidos mais de 10.000 assassinatos, homens e mulheres passeando à noite ou de madrugada, ou submetidos a injustos julgamentos sumários.

OP — Conte-nos sobre os seus projetos como escritor.

FNN — Permitam-me agradecer a Bubok e a si pela possibilidade que me ofereceu de publicar O Bosque das antas em espanhol e português. Quanto aos projetos, digamos que estou na hora de esperar e ouvir.

OP — Obrigada Chisco

Francisco Fernández Naval

 

 

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