26 de Setembro.
Tarde muito enevoada na praia (numa praia). A praia é extensa e está quase deserta. Algumas pessoas mergulham nas ondas e, bastante mais afastados, há surfistas que, deitados nas pranchas, se assemelham a focas. Na zona das dunas existe uma construção pré-fabricada, de madeira envernizada, que o ar marítimo corrompeu. À frente do edifício, virada para o mar, há uma esplanada debaixo de um grande toldo com duas ou três mesas ocupadas. Uma passadeira de placas de cimento sobre a areia conduz a um mastro branco onde uma bandeira vermelha se agita ao vento que sopra do sul. Algumas pessoas caminham sozinhas ou aos pares, ao longo da rebentação. Jovens jogam bola. Há pescadores dispersos pela praia; vestem impermeáveis, estão encapuzados, e vigiam as oscilações das ponteiras das suas canas indiferentes a tudo o resto. Bandos de gaivotas planam em círculos e emitem um piar entrecortado que o vento arrasta para longe.
Grandes variações e contrastes nas cores e na luz do dia. Nuvens espessas - o mar está cheio de manchas escuras das suas sombras. Espaços abertos no céu por onde o sol brilha. Neblina branca sobre o Espichel. Cortinas oblíquas de chuva sobre o horizonte. Não está frio. Sol, chuva e vento. Já não é verão e não é ainda inverno.
Sento-me na esplanada e bebo uma cerveja. Leio o jornal e observo o que se passa volta. Chegam mais pessoas em pequenos grupos. Umas ficam; o tempo desencoraja outras. O vestuário que trago: camisola amarela de lã, calções pretos, ténis pretos, toalha de praia.
O sol desce por trás das nuvens que não cessam de atravessar o céu. Nesta altura os dias ainda são compridos. Sinto uma euforia incontida minha volta, suscitada pela amplidão do espaço, o troar da rebentação, o vento incerto, a chuva do fim de verão.
Prometo-me que virei todos os dias até ao fim do mês, pelo menos.
Barco na Trafaria. Oscilação suave. Vibração das máquinas (motores) repercutindo por toda a estrutura da embarcação. Nevoeiro sobre o Tejo no fim do dia. Luzes acesas no ferry. Cheiro de tinta, sal e óleo. O barco afasta-se lentamente do cais perfurando o nevoeiro, ronda sobre estibordo e, subitamente, a escassos metros, surge a popa redonda e negra de um petroleiro. O ferry completa a manobra e acompanha o gigante, cuja sombra negra lembra um abismo. Por breves momentos estamos tão próximos que consigo ler, suspenso, acima do nível a que me encontro, o nome manchado pela ferrugem e desfocado pela neblina SOUTH WIND. Depois desapareceu, engolido pelo nevoeiro.